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Como era fácil


(Imagens: Marcelo Cortes/CRF)

Diz-se no folclore cult do futebol que há uma máxima em campeonatos de pontos corridos criada por Pep Guardiola. Retirada de uma conversa entre ele e o auxiliar Domenec Torrent (olha o Dome) aí, em que o catalão dizia o seguinte:
"Campeonatos de pontos corridos perdem-se nas oito primeiras rodadas, e ganham-se nas oito últimas."

O Flamengo agora, se esforça para provar a máxima ensinada ao catalão que passou por aqui. O problema é que pode comprovar tanto a questão da derrota quanto a questão da vitória.

Reparem bem:

O Flamengo hoje está a dois pontos do Internacional e, claro, depende de si mesmo por conta do confronto direto com o Internacional. 

Agora, olhando em retrospectiva para as primeiras rodadas do Flamengo no campeonato, ficam nítidos os pontos bobos perdidos ali.

Derrota contra o Atlético MG, apesar do gol contra, não conta, pois era um concorrente direto. Mas a derrota por 3x0 para o Atlético-GO e o empate com o tenebroso Botafogo deste campeonato pesam. Os cinco perdidos ali colocariam o Flamengo a três pontos de distância a essa altura do campeonato, podendo até mesmo perder o confronto direto da penúltima rodada. Na conta, ainda poderia se colocar um empate contra um Grêmio que já não é lá grandes coisas.

E tudo isso por quê?

Dome decidiu mexer na forma do time jogar. Soberano no pré-pandemia, os jogadores jogavam já no piloto automático, sabendo exatamente o que fazer em absolutamente todos os momentos.

Descaracterizou muito o time, que rateou bastante no início do campeonato.

E soubemos essa semana que não houve qualquer esforço da diretoria em entender a forma como Dome jogava ou mesmo um pedido para que mantivesse o formato Jorge Jesus.

E por isso o campeonato do Flamengo foi tão inconstante e o time, de fato, foi perdendo pontos bobos ao longo do Brasileirão. Fora os péssimos resultados em confrontos diretos.

Depois vem Rogério Ceni, que altera o formato mais uma vez. Mesmo dizendo querer emular o antigo estilo de jogo, ele jamais fez o que prometeu. Ao invés de dois atacantes, jogava em um 4-2-3-1 banal. O espaço entre as linhas era enorme, e os laterais eram todos espetados.

O time continuou sem se achar, e as críticas vieram com justiça.

Assim, chegamos as últimas oito rodadas do campeonato: a reta final. Segundo a lei, é a hora de ganhar o campeonato.

No primeiro desafio, uma vitória um tanto sem sentido. No jogo contra o Palmeiras, a estratégia era errada, o desenho ainda era o que Rogério Ceni tentou impor e o time alviverde era melhor. Teria sido normal se a bola de William Bigode entrasse aos 5' do primeiro tempo. Mas o time jogou bem, e no final os deuses definiram o destino do jogo, afinal o gol do atleta Pepê só pode ter vindo de providência divina, ainda que o gol contra bisonho da etapa inicial já fosse um indicativo.

No jogo seguinte, derrota frustrante. Muito na conta do contratécnico, que fez tudo pela derrota.

Entretanto, por sorte, o Flamengo não tinha oito jogos de reta final, mas nove. O jogo atrasado contra o Grêmio deu a oportunidade de fazer a maré virar. Ali se percebeu como era fácil.

Primeiro tempo de tentativas, mas sem brilho. O segundo tempo mudou tudo.

Mudou tudo mesmo. Foi a primeira vez em muito tempo que o time de fato jogou no modelo e no desenho de Jorge Jesus. Gabigol e Bruno Henrique próximos, pressão voraz na saída de bola, movimentação constante no campo de ataque, trocas de posições entre as duplas de meias e atacantes. Atuação avassaladora. 4x1 em 45 minutos. Soberano.

No jogo seguinte, Rogério nem sequer ousou voltar ao sistema anterior. Repetição do segundo tempo contra o Grêmio e em 20 minutos o jogo estava resolvido.

Ontem, contra o Vasco, a mesma coisa. Um jogo pretensamente chato pela dureza comum de um clássico contra o maior rival tornou-se uma peleja boa de se assistir pelo simples motivo de que jogávamos bem. Gabigol e Bruno Henrique muito ativos, um meio de campo que funcionava e dava dinamismo.

E o gol que resolveu o jogo foi definido pela última alteração que faltava para retornarmos ao modelo antigo: Filipe Luís jogando por dentro.

Dali ele ajudou a controlar o meio de campo, compôs maioria e foi dali que fez o cruzamento/passe brilhante que encontrou Arrascaeta sozinho na área. Dali a bola foi a Bruno Henrique e de resto vocês já sabem. Penalti, Gabi e gol.

No segundo tempo, a prova de que tanto tempo sem jogar no modelo ideal cobra algum preço. Hoje, qualquer time comum que tente atacar o Flamengo acaba conseguindo com alguma facilidade. E o Vasco conseguiu. Faltou qualidade técnica, essa é a verdade.

Do outro lado, o Flamengo passou um bom tempo errando tudo na frente e se recusando a matar o jogo. Mas o Mister Clássicos não perde uma oportunidade. Bruno Henrique desafiou as leis da gravidade, subiu mais alto que a trave e testou um tiro na meta de Fernando Miguel. 2x0 tranquilo.

(Imagens: Marcelo Cortes/CRF)


Está claro que o time não é e não será o que foi em 2019. A marcação é frouxa, a intensidade é outra, a precisão técnica não anda das melhores e já está claro que Rogério Ceni não é capaz de entender como funcionam ou de aplicar algumas ideias. A recusa em usar Pedro com outro atacante ao lado é a maior demonstração disso.

Mas os dois últimos jogos e meio provam como era fácil ter sido líder absoluto desde o início do campeonato. Era só manter a toada do ano anterior. Em uma época de tanta instabilidade para todo mundo, fazer funcionar um modelo já estabelecido seria o diferencial. Mesmo sem brilho, mesmo sem brio, era muito simples ter continuado com a mesma estratégia desde o início.

Faltando quatro jogos, agora será a hora da verdade neste campeonato.

É a hora de comprovar se a troca de estilo lá no início vai ter feito o Flamengo perder o Brasileirão nas primeiras oito rodadas, e se a alteração do modelo vai custar caro nas próximas partidas, ou se o retorno do velha fórmula vai ser o que fará o Flamengo ganhar o campeonato nas oito últimas.

Só o tempo dirá.

Próximo desafio, e talvez o mais difícil, Braga Bull no domingo.

No mais,
Saudações Rubro-negras.

Por Gabriel Félix
Colunista do Flamengo para o Linha de Fundo.

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