Não restam dúvidas sobre o bom trabalho de Sérgio Soares no Bahia
de 2014. O treinador soube transformar um elenco renovado - entre peças
desacreditadas pela torcida e jovens recém-promovidos da base – em um time
vibrante, intenso e que assimilou rapidamente conceitos atuais do futebol que
andava desprezados no Fazendão. Poucos jogadores foram contratados, nenhum da
“nata” do futebol nacional. Mesmo assim o clube cumpriu as metas estabelecidas
para a primeira parte da temporada e, tivesse copado a Lampions League, teria
alcançado um semestre perfeito, algo que o clube não obtém desde o longínquo
ano de 2001.
Mas vieram as derrotas para o Ceará e algumas feridas ficaram
expostas: O time tinha um bom padrão, mas era previsível; faltavam alternativas
para modificar panoramas adversos durante as partidas; o esquema principal
[4-4-2] estava engessado e fácil de ser anulado; o treinador rodava pouco o
elenco em jogos importantes e utilizava sempre os mesmos reservas nas mesmas
funções. Some-se a esses fatores a dificuldade financeira e estrutural do clube
para garimpar rapidamente reforços que suprissem as carências do time e a
contusão que deve afastar o principal jogador durante o primeiro mês de
campeonato brasileiro e voilá (ele): O espectro sinistro da desconfiança subiu
no telhado.
No empate de estreia contra o América Mineiro no Independência, o
Bahia utilizou o esquema mais habitual do ano: 4-4-2 em losango, com Maxi um
pouco mais recuado por dentro como “enganche”, Bruno Paulista e Tiago Real
pelos lados e Pittoni como único volante centralizado; Kieza e Zé Roberto no
ataque. Com essa formação o Bahia vencia por um a zero, dominava as ações e
desperdiçava chances. A contusão de Kieza no final da primeira etapa obrigou
Sérgio Soares a mudar o time. Querendo alterar o mínimo possível na estrutura
da equipe, ele optou por Willians Santana, em uma substituição direta, sem
mudança de posicionamentos em campo.
Contudo, é sabido até pela senhora que vende mingau de manhã cedo
no ponto da Brasilgás, que Willians Santana – não obstante as 17 canelas que
tem espalhadas pelo corpo (incluída nessa conta a que carrega no cérebro) –
atravessa um inferno astral mais severo que as chuvas torrenciais que desabam
na capital baiana. O infeliz foi incapaz de dar sequência a alguma jogada de
ataque e acabou com o plano de jogo do tricolor. Parecia que, de fato, ele
ainda jogava na equipe mineira, tal a insistência em tocar a bola para os
jogadores de verde e preto.
E assim, o que antes era dedução, inferência, transformou-se em necessidade:
Ou o Esquadrão mudava o esquema de jogo ou encontrava novas peças para fazer o
sistema rodar tão ajeitadamente quanto antes. A volta de Léo Gamalho
teoricamente supriria a ausência de Kieza, mas a fase do Ibrahimovic do Sertão
não inspirava melhores auspícios.
Para o confronto contra o Mogi Mirim, o estádio Metropolitano de
Pituaçu vazio (Bahia cumpria pena por baderna de torcida organizada no
Brasileirão 2014) sugeria mesmo um jogo-treino. Era possível ouvir as batidas
na bola e instruções, misturadas aos palavrões, vindo das casernas que
abrigavam os suplentes da chuva. Sérgio manteve o esquema da estreia, mas
surpreendeu alterando a função dos jogadores escalados: Adiantou Maxi para o
ataque, próximo a Gamalho que atuava como referência. O argentino viveu grande
fase no Vitória/BA atuando desta maneira, ao lado de Dinei; Tiago Real passou
do lado esquerdo para o centro, atuando como armador mais próximo à área
adversária; e Zé Roberto fez a função que era de Tiago Real, atuando aberto
pela esquerda com bastante liberdade para atacar e recompor fechando o setor de
Bruno Paulista para bloquear as subidas de Edson Ratinho.
Bahia iniciou confronto de sexta nessa formação: Zé recuado pela esquerda, porém chegando á frente com intensidade |
Não foi uma tentativa pioneira na temporada. No jogo de volta
contra o Sport pela semifinal do Nordestão, Sérgio tentou essa mudança com
Willians no lugar de Tiago Real, que estava suspenso. Não deu certo porque,
bem, é difícil algo dar certo quando Willians Santana está envolvido.
Na sexta feira as mudanças surtiram efeito em função do bom
desempenho do trio, especialmente Maxi e Zé que aproveitavam bem os vacilos da
defesa paulista com movimentação constante que abriam mais espaços e
desorganizavam as linhas do Mogi. Assim foram construídas as jogadas dos dois
primeiros gols na etapa inicial: Maxi em diagonal curta finalizando dentro da
área e Zé Roberto aproveitando cruzamento de Pirlottoni posicionando-se na área
“de surpresa”.
Momento exato do lançamento que inicia a jogada do primeiro gol: Zé recuado pela esquerda, defesa do Mogi desarrumada |
O Mogi Mirim do neófito técnico Edinho não parecia preparado para
anular essas variáveis. E tudo desmoronou de vez com a mudança de sistema do
Bahia para a segunda etapa: Desde a saída de bola o time tricolor avançou as
linhas e utilizou marcação pressão, agora com o time disposto no 4-3-3 base
alta. Bola recuperada no campo de ataque, transição rápida e conclusão de Zé
Roberto para o gol em 13 segundos. Gol mais rápido desde a saída de bola do
meio campo da equipe no ano.
Bahia aperta saída de bola e tira opções de passe do zagueiro: Observem que há superioridade numérica no campo de ataque |
Esse novo sistema permitiu uma participação maior de Léo Gamalho
no jogo: O centroavante, cornetado pela indolência em campo, fez o primeiro gol
dele pela série B, teve outro mal anulado, e concluiu corretamente mais três
vezes, além de efetuar um passe para finalização e um desarme certo. Boa
evolução para um jogador que costumava ser notado apenas pela quantidade de
vezes que arrumava o coque do cabelo.
Bahia reconfigurado para segunda etapa: Maxi e Zé abertos dando amplitude ao ataque, sem perder eficácia na recomposição |
Os números, aliás, reforçam que o time de Sérgio Soares tem
conseguido impor seu estilo de jogo aos rivais, mesmo sem conseguir atuar
próximo da plenitude técnica que a equipe já demonstrou na temporada. Teve mais
posse de bola e trocou mais passes que os adversários; finalizou mais e
desarmou mais também; como também errou mais lançamentos e teve muito mais
impedimentos. Ou seja: Tem buscado mais o jogo, mesmo que o faça, às vezes, de
forma não muito eficaz. As mudanças sinalizam para ajustes que minimizem esses
erros e potencializem as virtudes, preparando o time para os desfalques e
situações adversas que um campeonato longo exige: Exatamente como a expressão
em latim do título define: Mudando o que tem de ser mudado.
Alex Rolim || @rolimpato #BBMP
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