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Busby Babes, as flores de Manchester


Dia 6 de fevereiro de 1958. HĂ¡ 58 anos, acontecia um dos maiores desastres da histĂ³ria do futebol inglĂªs. A queda do aviĂ£o que transportava um dos times mais promissores da histĂ³ria do Manchester United marcou nĂ£o sĂ³ o clube, como o mundo inteiro, de uma forma que, atĂ© hoje, ninguĂ©m conseguiu colocar em palavras.

Contudo, para lembrar-se da maneira correta aquela geraĂ§Ă£o de ouro, nĂ£o se pode falar apenas dessa tragĂ©dia.

Os Busby Babes


O time comandado por Matt Busby era Ăºnico. O aspecto mais incrĂ­vel sobre essa equipe era o fato de quase todos os jogadores serem formados na base do United, algo incomum naquela Ă©poca. Antes da explosĂ£o dos “Busby Babes”, os jornais criticavam o fato de a maioria ter 21 ou 22 anos, mas isso nĂ£o incomodava o treinador.

Matt nĂ£o estava sozinho. Dentre as muitas pessoas que estavam com ele no clube, um nome em particular se destaca – e nĂ£o se esqueça dele. Jimmy Murphy era assistente tĂ©cnico de Busby e os dois levaram os “babes” ao topo.

Tudo começou em 1952-53 e, de lĂ¡ atĂ© 1958, o time conquistou dois tĂ­tulos da Primeira DivisĂ£o (atual Premier League) em 1955-56 e 1956-57 e dois Community Shield em 1956 e 1957. A equipe de Busby conseguiu ser o primeiro time inglĂªs a disputar a European Cup (atual Champions League), mesmo que o feito fosse contra a vontade da Football League.

O Ăºltimo jogo na Inglaterra

O dia 1º de fevereiro marcou o Ăºltimo jogo dos Busby Babes na Inglaterra antes do desastre. O Manchester United foi a Highbury – antigo estĂ¡dio dos gunners – enfrentar o Arsenal. As estrelas dos Red Devils nĂ£o desapontaram.

Em um jogo incrĂ­vel, os babes conseguiram vencer por 5×4 e mostraram porque estavam defendendo o tĂ­tulo. No aniversĂ¡rio de 50 anos da tragĂ©dia, o Arsenal escreveu sobre aquele memorĂ¡vel jogo: “Os Busby Babes deixaram todos aqueles que os viram com Ă³timas memĂ³rias para agraciar o futebol inglĂªs”.

A Ăºltima partida


Ă€ medida que avançava na European Cup, o Manchester ganhava confiança. Depois de uma vitĂ³ria em casa por 2×1, a equipe precisou viajar atĂ© Belgrado para enfrentar o Estrela Vermelha de Belgrado pelo jogo de volta das quartas de final. A partida terminou com o incrĂ­vel placar de 3×3 e o time visitante voltava para casa feliz.

O acidente

No dia 6 de fevereiro, um dia apĂ³s o empate contra o Estrela Vermelha, o Manchester United voltava para casa classificado. A viagem, que partiu da IugoslĂ¡via, tinha uma parada programada para que a aeronave reabastecesse. O destino era uma Munique encoberta pela neve e pelo mau tempo.

Assim que o aviĂ£o tentou decolar pela primeira vez, os membros da tripulaĂ§Ă£o perceberam que havia algo errado e trataram de resolver o mais rĂ¡pido possĂ­vel. Eles acreditavam que podia ser uma falha no motor, porĂ©m investigações posteriores provaram que o problema era uma camada de neve derretida na pista que causou a desaceleraĂ§Ă£o da aeronave.

Aquele voo precisava chegar a seu destino sem mais atrasos, jĂ¡ que a FederaĂ§Ă£o Inglesa proibiu o United de adiar o prĂ³ximo jogo. Na terceira tentativa, a aeronave nĂ£o conseguiu altitude o suficiente e se chocou com tudo que estava pela frente.

Harry Gregg, goleiro do time, ajudou vĂ¡rias pessoas que estavam dentro do voo. Mesmo abalado e com lesões, Gregg nĂ£o abandonou o aviĂ£o. Sua atitude, uma reaĂ§Ă£o imediata ao caos diante de seus olhos, salvou vidas.

Fatalidades

Placa que estĂ¡ no Old Trafford com o nome de todos os mortos no acidente,
Dois membros da companhia aĂ©rea morreram, sendo eles o copiloto Kenneth Rayment – sobreviveu Ă  queda, mas faleceu trĂªs semanas depois no hospital – e Tom Cable, comissĂ¡rio de bordo.

Oito jogadores do Manchester United perderam suas vidas naquele acidente: Geoff Bent, Roger Byrne, Eddie Colman, Duncan Edwards – um dos jovens mais promissores da Inglaterra, morreu 15 dias depois no hospital – Mark Jones, David Pegg, Tommy Taylor e Liam “Billy” Whelan. O clube ainda deu adeus a trĂªs membros de seu staff, sendo eles Walter Crickmer, secretĂ¡rio, Tom Curry, um dos treinadores, e Bert Whalley, treinador chefe.

Dez passageiros, entre jornalistas e civis, também perderam suas vidas: Alf Clarke (Manchester Evening Chronicle), Donny Davies (Manchester Guardian), George Follows (Daily Herald), Tom Jackson (Manchester Evening News), Archie Ledbrooke (Daily Mirror), Henry Rose (Daily Express), Frank Swift (News of the World,) Eric Thompson (Daily Mail), Bela Miklos (agente de viagem) e Willie Satinoff (torcedor).

Sobreviventes

Quatro membros da tripulaĂ§Ă£o: Margaret Bellis (comissĂ¡ria de bordo), Rosemary Cheverton (comissĂ¡ria de bordo), George “Bill” Rodgers (radio officer) e o piloto James Thain.

Entre outros passageiros, Ted Ellyard (Daily Mail, telegrafista), Peter Howard (Daily Mail, fotĂ³grafo), Frank Taylor (News Chronicle, repĂ³rter), Vera Lukic e sua filha Vesna – as duas foram salvas por Harry Gregg –, Eleanor Miklos (mulher de Bela Miklos, morto no acidente) e NebojÅ¡a Bato TomaÅ¡ević (diplomata) sobreviveram.

Nove jogadores do United sobreviveram. Johnny Berry (falecido em 1994) e Jackie Blanchflower (falecido em 1998) nunca mais puderam jogar por conta da gravidade das lesões sofridas. Kenny Morgans (falecido em 2012) pode até ter voltado a campo, mas nunca mais foi o mesmo.

Ray Wood (falecido em 2002) tambĂ©m voltou, mas nĂ£o teve oportunidades. Bobby Charlton, Bill Foulkes (falecido em 2013), Harry Gregg, Albert Scanlon (falecido em 2009) e Dennis Viollet (falecido em 1999) foram os Ăºnicos que seguiram normalmente suas carreiras.

AlĂ©m desses, Matt Busby tambĂ©m sobreviveu. Depois sĂ©rios problemas causados pelo acidente – ele fraturou a costela, teve uma perfuraĂ§Ă£o em um pulmĂ£o e lesões na perna –, Busby conseguiu se recuperar e voltou a comandar o clube cinco meses depois. Ele quase desistiu de tudo e por muitos anos se sentiu culpando, desejando atĂ© ter morrido naquele dia, mas sua mulher disse que “os garotos iam preferir que ele continuasse”. O treinador faleceu em 1994.

A reconstruĂ§Ă£o

"Mantenha a bandeira voando, Jimmy"
Jimmy Murphy teve que assumir o clube no meio do caos e da dor causados pelo acidente. O assistente, que nĂ£o viajou com a equipe, precisou recrutar todos os jogadores disponĂ­veis em qualquer clube para continuar com o trabalho. Jimmy carregou o Manchester nas costas, impedindo atĂ© que o United fosse fechado.

A primeira partida disputada pelos ainda traumatizados Red Devils foi no dia 19 de fevereiro contra o Sheffield Wednesday pela quinta rodada da FA Cup. Na sĂºmula, onze espaços em branco. Em campo, a remendada equipe conseguiu vencer por 3-0. O United chegou Ă  final e conseguiu o incrĂ­vel vice-campeonato apenas trĂªs meses depois da tragĂ©dia.

Na final contra o Bolton, Matt Busby voltou pela primeira vez para o banco de reservas, mas apenas como espectador. A camisa do United tinha, naquele momento, o brasĂ£o de uma fĂªnix ressurgindo das cinzas.

Mesmo com o time quebrado, o Manchester United disputou a semifinal da European Cup contra o Milan no dia 8 de maio, ganhando o primeiro jogo por 2×1, mas perdendo o segundo por 4×0 seis dias depois.

Os sete jogadores que ainda tinham condiĂ§Ă£o de seguir a carreira voltaram para o time, e aos poucos o United se reergueu. Matt Busby retornou, o time foi reconstruĂ­do, uma nova geraĂ§Ă£o vitoriosa chegou. Bobby Charlton se tornou o maior Ă­dolo da histĂ³ria do Manchester United. Dez anos depois, o time conquistaria seu primeiro tĂ­tulo europeu. Foi um perĂ­odo longo e muito difĂ­cil na histĂ³ria do clube, mas, apesar das fatalidades, tudo deu certo no fim.

Homenagens


Tive duas oportunidades de ir ao Old Trafford e ainda nĂ£o consigo explicar a sensaĂ§Ă£o de entrar na parte do museu dedicada aos Busby Babes. Ao fundo, o som do rĂ¡dio noticia algo relacionado Ă  Ă©poca; os jornais que demonstram a incerteza, as frases ditas por membros do clube mostram toda a dor daqueles dias. No tour pelo estĂ¡dio, Ă© possĂ­vel ver, alĂ©m do memorial com a foto dos jogadores, um relĂ³gio que marca a hora exata da queda da aeronave.

Uma mĂºsica chamada “The Flowers of Manchester” foi composta e conta a histĂ³ria do acidente. No cinema, o filme “United”, lançado em 2011, Ă©, atĂ© hoje, a melhor e mais emocionante produĂ§Ă£o sobre o acidente. Recomendado a todos os fĂ£s de futebol. Assista a homenagem de torcedores aos Busby Babes e o trailer do filme:

Mesmo depois de tantos anos, ainda Ă© difĂ­cil lembrar este momento. Se nada tivesse acontecido, seria aquela a geraĂ§Ă£o mais vitoriosa da histĂ³ria? Aquele 6 de fevereiro de 1958 mudou completamente a histĂ³ria de muitas pessoas e do Manchester United. Vinte e trĂªs vidas foram perdidas naquele dia, mas elas nunca serĂ£o esquecidas.

"Apesar de lamentar nossos mortos e chorar por nossos feridos, acreditamos que os bons dias nĂ£o acabaram para nĂ³s. A estrada de volta pode ser longa e difĂ­cil, mas com a memĂ³ria daqueles que morreram em Munique, o Manchester United renascerĂ¡.”

“Antes da queda, o Manchester United pertencia Ă  Manchester. Depois, pertencia ao mundo”.

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