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Obrigado por todas as noites de lágrimas


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(Gilvan de Souza/Flamengo)



Eu chorei.

Você chorou.

Choramos muitos, menos alguns, porque assim é toda boa noite de Flamengo.

Júlio César.  O maior dos que vi.

Lembro da primeira vez que fui ao Maracanã. Você estava lá, com cara de moço, em uma derrota para o Vasco. Era uma época em que nosso melhor jogador, além de você, era o Iranildo.
Lembro do primeiro título do Flamengo que guardo na memória. Você estava lá, parando Viola, Euler e Juninho Paulista. Garantiu lá atrás para que Pet viesse a glória lá na frente. Depois daquele dia, comecei a brincar de ser goleiro na pelada do prédio.
Lembro do primeiro título da seleção que vivi de fato. Para muitos, Adriano foi o grande herói com aquele gol do final. Mas foi você que garantiu o caneco nos pênaltis. Foi naquele dia, que comecei a tentar descobrir os segredos de pegar pênaltis.
Por falar em seleção, lembro da primeira vez que vi aquela camisa amarela na minha frente. Aquela festa no Maraca. Você estava lá. Tudo bem, não era um amarelo, mas ainda que não precisasse trabalhar muito naquele 5x0 contra o Equador, olhei para você por diversas vezes.
Assim como ontem. Foi um desses dias que jamais esquecerei, em mais uma das noites em que você, seu chorão, me deixou com os olhos marejados ao extremo.

Júlio Cesar sempre foi para mim, um herói. No dia em que ouvi no rádio, indo para a escola, que você estava indo embora, fiquei chocado. Não sabia nem que isso existia direito.
Foi depois de um jogo em Volta Redonda, contra o Cruzeiro. Um jogo inacreditável, em que nos salvamos do rebaixamento com uma vitória de 5x0 em que você pegou muito. Quer mais paradoxal e Flamengo que isso?
Aliás, quantas vezes você nos salvou...você não foi só um goleiro. Foi um guarda redes, como dizem os homens da terrinha. Se hoje o Flamenguista bate no peito para dizer que nunca foi rebaixamento, foi por sua causa é pelo menos dois anos. Nosso último homem. Nossa última esperança. O homem que salva.
No dia em que você fez aquela defesa no chute do Messi eu saí na rua todo bobo. Era o meu goleiro fazendo aquilo. Aliás, ao contrário do Buffon, você pode dizer que terminou a carreira sem tomar gol do argentino.
Você fez um dos jogos mais impressionantes de um goleiro que vi. Brasil 1 x 0 África do Sul. Semifinal da Copa das Confederações. Fico impressionado vendo os melhores momentos até hoje.
Em 2010, chorei a primeira vez por você. Era o melhor goleiro do mundo. Não merecia ter tomado aquele gol bobo. Mesmo assim, ali vi mais uma vez meu ídolo. Um homem que falhou, mas foi o primeiro a dar entrevista. Saiu de cabeça em pé, como os grandes fazem.
Dali pro Queens Park Rangers. Aonde você foi se enfiar, Júlio? No último colocado do campeonato inglês. Isolado, mas fazendo defesas absurdas, com uma zaga aberta. Deve ter visto Wellinton e Álvaro jogando aqui e sentiu saudades do Flamengo. Só pode.

Ali comecei a te esperar. Talvez, quem sabe, você resolvesse dar as caras aqui e ver se salvava a gente em anos tenebrosos de novo.
Mas lembro da facada no coração que foi quando você disse que não voltaria. Fazer o que, né? Decisão sua. Mas eu sabia que você estava machucado desde a Copa. Você podia até achar que não ia rolar, mas eu esperava mesmo assim.

Depois, Toronto. Te defendi com todas as minhas forças contra aqueles que não te queriam na seleção. Fiz teimosias e promessas para que uma camisa sua do inexpressivo Toronto FC parasse no meu armário.

Em 2014, chorei por você mais uma vez. Nas oitavas, quando você nos salvou no tempo normal e nos pênaltis, de uma derrota humilhante para o Chile. Chorei porque era você, e por tudo que você tinha passado para chegar ali.
Mas naquele dia, na fatídica tarde de 8 de julho, chorei por você mais do que por qualquer outro. Você não merecia isso. Para sempre, provavelmente, será o goleiro brasileiro que mais tomou gols em copas do mundo, sem ter sequer uma falha.
Naquele dia, aprendi que mesmo os heróis caem, que há momentos em que a vida se torna implacável e tudo que você pode fazer é deixar passar e levantar a cabeça. Como você fez. Senti cada gol que você tomou, mas me impressionei em cada uma das vezes que você levantou.

E demorou, hein, cara? Mesmo depois disso, foram 4 anos esperando você voltar.

E quando voltou, fiquei meio revoltado com a maneira com que te trataram. Jogando em Volta Redonda, com um time de camisa amarela. Mas tudo bem, era você. Reparei na sua barba branca, na aura serena em volta de você.
Vi você por 15min de novo, no aquecimento para o Flamengo x Botafogo no carioca. O arrepio veio na espinha e eu sabia que não podia deixar de ver você pelo menos mais uma vez.

Ontem, eu sabia que faria como você, sem conseguir segurar as lágrimas. E assim foi.

Quando você entrou em campo, eu me arrepiei. Quando você discursou, eu cantei e pedi que ficasse, mesmo sabendo que não dá mais.

E como naquele 5x0, olhei para você mesmo nos gols. Lá de cima da arquibancada, fiquei olhando para você enquanto Dourado batia o pênalti. A torcida grita e você dispara como uma criança, tomada pela alegria de ver o Flamengo vencer, em direção aos companheiros.

Passei o jogo temendo um gol em você. Mas como em todas as outras vezes, você não me decepcionou. Liderou lá de trás, deu esporro em todo mundo várias vezes e pegou tudo que veio, relembrando os tempos de garoto.

Quando o jogo acabou, as lágrimas vieram pelo meu rosto. Tudo que eu queria naquele momento era ser Paquetá e Vinicius, correndo pelo gramado e pulando em cima de você. E Num abraço apertado de admiração e respeito poder dizer, obrigado.

Mas quem fez isso foi você. Veio andando do outro lado do campo e parou na minha frente. Eu lá de cima, vi você ajoelhar na minha frente e não consegui me controlar.

Mais uma vez eu entendi porque você foi tão especial. Nós somos iguais. Nós somos Flamengo. Você faz parte de nós e assim como nós vamos ao Maracanã para agradecer o fato de sermos parte daquela multidão, você também é parte desses muitos, menos alguns.

Flamengo o suficiente para aos 20 anos sacanear publicamente o presidente rival.

Flamengo o suficiente para correr com a bola de uma área até quase a outra, como um louco torcedor sem saber o que fazer para vencer mais uma peleja.

Flamengo o suficiente para fazer um contrato de três meses pra ficar aqui, mesmo criticado por uma galera, que nunca entendeu a relação que nós tivemos. Pedi para um louco para que você ficasse, mas sei que não dá.

É, tem certas coisas que precisam acabar. Tem certas histórias que precisam ter fim. E só assim, essas histórias se transformam em lendas. E foi isso que você se tornou ontem.

Nesses momentos em que você se dá conta da grandeza.

E nos despedimos do melhor jeito possível. Você, eu, o Maracanã. A festa mais linda do planeta.

Que façamos sempre festas assim para homenagear as nossas lendas. Que tenhamos sempre lendas como você.

Você é hoje um daqueles a quem nos referimos como você se refere a Zico: ídolo.

O melhor goleiro da história do Flamengo. Talvez também o maior.

Mas para mim, você sempre será mais do que simplesmente Julio Cesar Soares Espíndola.
Você será sempre um herói. Em todas as minhas lembranças de cada momento, em cada noite que passamos juntos. Em cada choro.

Assim como o de ontem no Maracanã, nessa simbiose de emoções incrível que chamamos de Flamengo.

Obrigado, ídolo. Por tudo.

No mais,
Saudações Rubro-negras.

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