"Muitos homens desejam a minha morte. Sangue nos meus olhos, e eu não consigo ver. Estou tentando ser o que estou predestinado a ser e os outros tentando tirar minha vida”
Tom Brady já usou a música de 50 Cent para rebater os haters. Era 2019, playoffs da temporada 18. Muitos homens desejavam que ele parasse de jogar. Brady era criticado pelo ano irregular. Irregular ou não, aquela temporada lhe deu o sexto anel e uma penca de recordes, como o primeiro jogador a ter seis títulos de Super Bowl e também o quarterback mais velho (aos 41 anos) a vencer a final do campeonato. Brady quebra recordes com a naturalidade de quem nasceu predestinado, como cantam os versos de “Many men”. O “irregular” dele era melhor do que muitos homens apresentaram no auge.
Brady é movido pela descrença desde o começo. A trajetória na NFL começou sob muita suspeita. Foi apenas o 199 jogador selecionado no draft do ano 2000. Absurdos 198 (!!!) atletas foram considerados melhores do que ele. Um jogador rejeitado basicamente por todas as franquias. Alto, desengonçado, franzino, pouco impressionante nos treinos, subestimado. Não demorou muito para virar protagonista da liga mais valiosa do esporte mundial durante duas décadas.
Toda crítica virou combustível. Não aceitou nunca dar menos do que 100% em campo. Isso faz dele vencedor. Sim, faz, no presente mesmo. Porque, mesmo aposentado, os recordes vão ser lembrados a cada nova temporada, como um flashback - o que não os deixará no passado.
Eu sei que bem no fundo mesmo os haters são gratos por terem visto Tom Brady em ação. Afinal, ele só é odiado porque é bom, porque vencia os adversários - triturava, foi protagonista de viradas inimagináveis. O jogador que todo mundo queria ter.
Foram 22 anos dedicados à NFL. Aos 44 anos, se aposentou com a certeza de que a carreira de jogador “foi emocionante e muito além da imaginação”. Imaginação… Ainda que ser um jogador de sucesso faça parte do imaginário de boa parte dos garotos, chegar onde Brady chegou requer uma dedicação (e uma série de abnegações) muito real. Com sete títulos, o camisa 12 é o atleta com mais Super Bowls da história; tem mais prêmios de MVP do Super Bowl (cinco); mais jardas aéreas na carreira (84.520); mais passes para touchdown (624); mais vitórias como quarterback (243); e mais passes completos na carreira (7.263). Dentre tantos feitos, difícil eleger o maior. Talvez o Super Bowl 51 seja o mais lendário. Depois de ver o Atlanta Falcons abrir 25 pontos de vantagem, comandou uma reação histórica do New England Patriots. Mas o que são 25 pontos para quem, pacientemente, viu 198 jovens serem “draftados” antes, lutou pela titularidade e, mesmo depois de campeão, ainda era questionado?
Eu conheci Brady em 2011. Digo conheci, porque depois de 10 anos o acompanhando, já é tipo da família. Aquela temporada foi traumática. Posso dizer que conheci Brady frustrado e aprendi a gostar dele pela forma como nunca se contentou em não ser o melhor. Naquela temporada, os Patriots chegaram ao Super Bowl. O adversário era o Giants - aquele mesmo que já havia derrotado New England em 2007, numa temporada quase perfeita, quando os Pats venceram todas as partidas, menos o Super Bowl. De que adiantava a campanha invicta, os bons jogos nos playoffs, se o título não veio? Era o que sempre dizia Tom Brady. Até disse que trocaria dois de seus tantos anéis só para ter aquele de 2007. Mas voltemos a 2011: os Giants cruzavam novamente o caminho de Brady, só podia ser para a redenção, não é mesmo? Faltou avisar ao Ely Manning, que comandou os nova-iorquinos a mais um troféu.
Toda essa volta à memória foi para dizer que até quando esteve por baixo, Brady foi gigante. Ele não sabe, provavelmente nunca vai saber, mas plantou em mim, naquela temporada cheia de erros, percalços e que terminou derrotada, a sementinha do futebol americano. Assim como eu, Brady formou uma legião de apaixonados pela NFL. Tem sinal de grandeza maior do que inspirar uma geração? Tudo o que esse cara proporcionou ao futebol americano vai estar sempre nas minhas melhores memórias.
O tempo é um adversário implacável. No fim, não há como vencê-lo. Brady é a prova de que nem o maior de todos consegue.
Janaína Wille | @janainawille | @LF_Site
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