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Linha de Fundo entrevista: André Rocha

Uma capacidade incrível de fazer análises táticas claras e inteligentes. Essa é a característica marcante de André Rocha, o entrevistado da vez no Linha de Fundo.


André é, atualmente, comentarista e blogueiro da ESPN. Coautor dos livros "É Tetra - A conquista que ajudou a mudar o Brasil" e "Flamengo 1981", já teve seu blog hospedado no Globoesporte.com e também já comentou jogos no Esporte Interativo.

O jornalista, que se tornou em uma espécie de referência no que diz respeito a análises táticas, concedeu-nos uma entrevista e falou um pouco sobre sua carreira, suas principais influências no jornalismo, o futebol brasileiro e outros temas importantes.

Gostaríamos de agradecer pela disponibilidade e gentileza ao atender o convite da nossa equipe. Desejamos ao André todo o sucesso do mundo e que ele continue nos brindando com suas excelentes análises durante muito tempo.

Confira a entrevista completa:

Como foi o começo da sua carreira? Qual você considera o momento mais marcante da sua trajetória?
Bem, a minha carreira começou antes mesmo de ser jornalista. Eu participava no finado Orkut da comunidade "Mauro Beting" e qual não foi minha surpresa quando o próprio pediu para reproduzir em sua coluna uma frase sobre a Copa de 1998.

Continuamos mantendo contato e quando ele foi para o Lance me convidou para escrever sobre futebol carioca no seu blog. Meses depois o próprio Mauro me indicou para comentar jogos na TV Esporte Interativo, ainda no início.

Como não tinha experiência em TV nem era jornalista, não deu para prosseguir, mas despertou o desejo de ingressar nessa área. Aos 34 anos entrei na faculdade, me formei aos 38. Blogs, livros, participações em TV e rádio... Sigo na luta.

Como surgiu sua vontade de ser jornalista? Você sempre esteve focado a seguir essa profissão?
Acho que a resposta anterior contempla essa primeira pergunta. Quanto ao desejo, até pensava na infância e início da adolescência, mas perdi meu pai aos 15 anos e a vida teve que seguir outros rumos. Mas nunca é tarde.

Você teve alguma inspiração quando criança ou quando decidiu seguir o caminho do jornalismo?
Minhas referências eram Washington Rodrigues, ainda hoje ativo na Rádio Tupi daqui do RJ, e Luiz Mendes. Depois Mauro Beting, PVC, Mauro Cezar Pereira, Calçade, Lédio Carmona e tantos outros. Muitos conhecidos, outros nem tanto.

Você atuou em outras áreas do jornalismo ou logo de cara começou na área esportiva?
Só trabalhei com futebol até hoje. Mas nada impede que atue em outras áreas. Jornalista tem que saber escrever e pesquisar. O resto ele se vira, estudou para isso.

Atualmente, você é referência para muitos jovens que almejam seguir a profissão de jornalista e são apaixonados por análises táticas. Como você se sente quanto a isso?
Acho que a maior realização é ver jovens escrevendo sobre um tema antes tão desprezado. Não fui precursor dos blogs sobre tática, antes havia o Eduardo Cecconi no Rio Grande do Sul e alguns poucos. Mas acredito que ajudei a popularizar com uma linguagem mais simples, de fácil assimilação.

Qual a sensação de um jornalista diplomado e reconhecido (igual a você) ouvir comentários errôneos de ex-jogadores sem preparação nenhuma nas TVs?
Problema não é ter ou não diploma. É ver gente vivendo de grife, tratando o cargo de comentarista como prêmio de consolação, bengala ou escada para aparecer e acabar em algum clube, tirando as melhores oportunidades de profissionais mais preparados.

Muitos acham que a tática engessa o jogo de futebol. O que é possível ser feito para mudar essa perspectiva?
O futebol é essencialmente tático. Até quando o talento sobressai. Infelizmente no Brasil ficamos com o legado de Nelson Rodrigues, que escrevia sobre futebol com outros propósitos, em outros tempos. Mas aos poucos essa visão estereotipada vai ficando para trás. Não sei quantos 7 a 1 serão necessários para isso.

Dunga mostrou-se um técnico um tanto quanto atrasado, com conceitos atrasados e pouco a acrescentar para a filosofia de jogo brasileira. Quais são suas perspectivas sobre o trabalho dele? Achas que vai dar certo?
Dar certo para ele é vencer. Para mim é ter desempenho, jogar bem e, por isso, vencer. Não sei se conseguiremos isso com o Dunga.

Você, por exemplo, não esconde que foi o Flamengo que despertou sua paixão pelo futebol. Achas que jornalista deve declarar para qual time torce (ou algum dia torceu)?
Só posso responder por mim. Declaro e assumo os bônus e ônus.

Há pouco tempo, veio à tona um grande escândalo envolvendo a CBF e a Copa do Mundo de 2014. Qual a sua opinião sobre o assunto?
É a chance de mudarmos o status. Não pode ser desperdiçada, até porque se nada acontecer de concreto com tantas acusações de corrupção surgindo todos os dias, a credibilidade do esporte ficará manchada para sempre.

O futebol é um ambiente milionário, que movimenta muito dinheiro em um país de muitas desigualdades. Qual sua opinião em relação aos salários pagos atualmente nos grandes clubes brasileiros?
O futebol movimenta muito dinheiro e é natural que os protagonistas sejam muito bem remunerados. A questão no Brasil é a capacidade do clube pagar esses salários milionários e também as suas dívidas de gestões anteriores. Sem contar o "pacote" de reforços quando o time está mal que muitas vezes é contratado sem planejamento, furando o orçamento por puro populismo dos dirigentes amadores.

Vivemos, já há algum tempo, um processo constante de elitização do futebol brasileiro. Qual a sua opinião sobre as consequências que isso acarreta?
É preciso haver espaços e preços para todas as classes nos estádios. Encontrar a melhor combinação de "negócio" e "paixão". Feito isso, como cada um se comporta é uma questão particular. Esse papo de "ensinar a torcer" é muito chato. Eu mesmo quase não gritava e cantava no Maracanã durante a partida por estar completamente absorvido pelo jogo. E, para ser sincero, acho que o time deve ser o termômetro da torcida, que precisa ter um mínimo de sensibilidade para saber a hora de apoiar e cobrar.

Como você vê essa nova geração no futebol brasileiro, que estuda futebol e tem vontade de mudar? Vai ser difícil alterar nossa cultura do achismo?
É um início de um caminho sem volta. Mas pior que o achismo é a polêmica barata, polêmica pela polêmica que atrai tanto a atenção e desvia o foco do debate do que é realmente mais importante.

Como você vê essa relação de dependência do Neymar, sendo ele sempre o centro das atenções e sem ninguém pra dividir a responsabilidade na Seleção?
Natural pelo abismo entre um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro e uma geração que devia estar entrando aos poucos na seleção, amparada por Kaká, Robinho, Diego e Adriano que por motivos diversos não têm mais condições de jogar em alto nível.

Pelé teve Garrincha, Zico teve Falcão, Romário teve Bebeto, Ronaldo teve Rivaldo, Ronaldinho teve Kaká. Neymar não tem ninguém para dividir responsabilidades. É um talento solitário e absoluto no Brasil aos 23 anos. Ele paga por isso e a seleção também.

Que recado você deixaria para seus fãs e jovens como nós, que estudam muito pra tentar mudar o panorama do futebol brasileiro?
Jornalista não deve ter fã. Mas agradeço o carinho dos que respeitam e admiram meu trabalho, que está no começo - sou formado há três anos. Quanto ao estudo, é seguir em frente. Devagar as coisas vão mudando. Abraços a todos!

Gabriel Antony | @gabrielantony_
Janaína Wille | @janainawille

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