A discussão da
divisão dos direitos de TV é antiga e motiva polêmicas sempre que levantada.
Como cada país divide a fatia do dinheiro das transmissões entre os clubes?
Como isso influência na competitividade e crescimento da Liga? Como é a
disparidade entre os clubes considerados grandes e pequenos e como essa divisão
influencia no rendimento dos clubes de forma continental?
Fizemos um
levantamento das quatro principais ligas da Europa – Inglaterra, Alemanha,
Itália e Espanha – para apresentar as diferenças e disparidades de como o
dinheiro da TV são divididos entre os clubes, - levando em conta somente as
transmissões domésticas - ou seja, como os ingleses, alemães, italianos e
espanhóis assistem suas próprias ligas dentro de casa.
Inglaterra - Onde tudo é perfeito
Existe uma
grande parcela de saudosismo quando se diz que o Brasil é o país do futebol, já
que na verdade esse título é muito mais aplicável aos ingleses. O futebol na
terra da rainha é tratado com o devido respeito e valor que ele realmente tem
que ter. O dinheiro das cotas de TV é separado em três grandes pacotes: Um
valor fixo, um por mérito e um de acordo com a audiência.
A primeira
parcela é dividida igualmente pelos clubes, independente do “tamanho”. Na
última temporada esse valor foi de 65,5 milhões de Euros por clube. A segunda
parte obedece à colocação do clube na última temporada, a cada posição é pago
1,5 milhões de Euros, ou seja, o último colocado ganha 1,5 e o campeão 30
milhões de Euros. A terceira fatia é dividida de acordo com cada jogo
transmitido pelo clube, que recebem aproximadamente 950 mil euros por
transmissão.
Essa divisão
justa, faz da Premier League Inglesa o campeonato mais atrativo do mundo. O
valor fixo garante a clubes “menores” um bom poder de investimento no mercado.
O prêmio por mérito estimula a competição até o fim, fazendo com que times que
estão no meio da tabela ainda joguem seu melhor em busca de mais uma fatia para
a próxima temporada. E o valor pago por jogo transmitido garante que os clubes
de grande torcida e consequentemente maior audiência também fiquem satisfeitos.
Espanha - Dois times, um abismo e o resto
Quando se fala
em direitos de TV, a Espanha tem de longe o pior modelo; muito parecido com o
brasileiro, sendo que a grande diferença está no fato de existirem na Espanha,
dois clubes gigantes e o resto, enquanto por aqui, ainda temos valores
intermediários. Outra semelhança com o modelo brasileiro, é que lá, como cá, os
direitos são negociados de forma individual com cada clube, o que faz com que cada
um peça o que acha que vale. E claro que Barcelona e Real Madrid acham - e na
verdade realmente valem - muito mais do que os outros dezoito times da liga.
Na ultima
temporada, merengues e culés ganharam 140 milhões de Euros cada um. O Valencia
é o time que chegou mais perto - se é que podemos dizer assim – recebendo 48
milhões, Atlético de Madrid aparece em quarto com 42 milhões, depois três times
receberam 32 milhões e esse valor vai diminuindo até os quatro últimos que
ganham 18 milhões cada, valor quase oito vezes menor que Barcelona e Real
Madrid.
Essa
distribuição na Espanha tem mais desvantagens do que vantagens. Só Barcelona e Real saem ganhando,
consequentemente se tornando mais fortes também na Europa. Em contrapartida, a
liga vai ficando cada vez mais desinteressante, com um campeonato inteiro
resumido a dois jogos entre os dois. Nas ultimas temporadas o Atlético
conseguiu quebrar a hegemonia e se sagrar campeão, com um mérito gigantesco
vista a diferença de poder de investimento. Resta saber se foi só um caso
isolado, ou se isso vai se tornar uma tendência dos colchoneros.
Alemanha - Onde a economia forte acaba atrapalhando
A Alemanha tem
algumas particularidades quando se trata de direitos de TV. A primeira delas é
que o contrato principal de transmissão engloba a primeira e a segunda divisão,
segundo a Liga, isso é uma medida para manter os times das duas divisões
fortes. Em contrapartida, significa menos dinheiro para ser dividido. Outro
fato interessante é que a forte economia da Alemanha – muitos apontam como o
melhor cenário econômico de toda Europa – acaba atrapalhando o valor arrecadado
pelas TVs. O alemão, falando de forma geral, tem mais dinheiro para ir aos
estádios, somando a isso um valor de ingresso mais baixo se comparado a outros
países europeus, surge o desestímulo e uma relativa baixa a audiência do
futebol na TV.
O atual
contrato de transmissão do futebol alemão gira em torno de 628 milhões de Euros
por temporada. A divisão desse valor segue um ranking de desempenho das últimas
cinco temporadas. Considera-se a posição de cada time na tabela e atribui-se um
peso maior para as temporadas mais recentes. Os 36 times da primeira e segunda
divisão são pontuados de acordo com a posição na tabela. O campeão da primeira
divisão recebe 36 pontos e cada time abaixo vai diminuindo um ponto. Assim, o
ultimo colocado da segunda divisão recebe apenas um ponto.
Cada ponto é
multiplicado pelas temporadas anteriores. A ultima temporada vale cinco pontos,
a penúltima quatro, três temporadas antes três, quarta temporadas dois e à
quinta temporada mais antiga atribui-se um ponto. Assim, depois de formado o
ranking uma parte do dinheiro vai para um fundo de desenvolvimento da liga. Do
restante, 80% vão para os clubes da primeira divisão e 20% para os da segunda.
Na Bundesliga, o primeiro colocado recebe exatamente o dobro do ultimo, entre
um e outro há uma diferença proporcional. Na 2ª divisão da Bundesliga essa
proporção é de 2.25, ou seja, o campeão recebe 2.25 vezes mais que o ultimo
colocado.
Como o
dinheiro da TV não é tão significativo assim para os clubes alemães o que acaba
determinando o poder de investimento dos clubes são os acordos comerciais de
patrocínio. Nisso o Bayern de Munique leva enorme vantagem, o que vem se
traduzindo dentro de campo, os bávaros parecem não ter oponentes dentro de casa
e na Europa se tornam cada vez mais fortes se colocando entre os maiores do
continente.
Itália - Onde a torcida faz o time
Na Itália,
existe um acordo coletivo para divisão dos direitos de TV, e isso é lei desde
2008. Na última temporada foi distribuído um total de 943 milhões de Euros em
direitos de transmissão. Esse valor é dividido em três partes, 40% é dividido
igualmente entre os clubes, 30% de acordo com o tamanho da torcida, – 25% pela
base de torcedores e 5% levando em conta a população da cidade-sede – e os
outros 30% são repartidos de acordo o desempenho do clube – 5% pela ultima
temporada, 15% pelas ultimas cinco temporadas e 10% levando em conta desde a
temporada 1946/47.
Esses 30%
divididos de acordo com o tamanho da torcida acabam colocando a Juventus no
topo da lista, com a arrecadação de 100 milhões de Euros. Milan e Inter vêm
logo abaixo com 90 milhões, Roma e Napoli ficam com 65 milhões e a Lazio com 50
milhões - metade do que recebe a Juve. Na ultima temporada, o lanterna recebeu
24 milhões de Euros.
A Juventus
acaba recebendo mais que o dobro do que recebe o Bayern na Alemanha, por
exemplo, mas a economia italiana anda de mal a pior e isso reflete diretamente
no futebol. Dentro de casa, a Juve acaba se beneficiando com sua grande torcida
e vai garantindo a hegemonia no campeonato, mas fora do país, os clubes
italianos não conseguem bons resultados, caindo cada vez mais no coeficiente de
desempenho da UEFA.
Quem não precisa se mexer
Os ingleses
são de longe o melhor cenário quando se fala em direitos de transmissão, não à
toa a Premier League é a preferida de grande parte do publico. Se existe uma
critica é com relação aos valores fora da realidade aplicados pelos clubes, com
o grande poder de investimento jogadores relativamente comuns acabam sendo
supervalorizados e ao mesmo tempo em que isso eleva o patamar da Liga também
acaba ferindo a saúde financeira e comprometendo o chamado Fair Play financeiro
adotado pela UEFA. Hoje os clubes ingleses parecem estabilizados, mas será que
um dia essa conta vai chegar? E quando chegar o dinheiro da TV vai ser
suficiente para suprir as necessidades?
Na Alemanha
existe um clube fazendo tudo perfeito enquanto os outros 17 só precisam copiar.
O dinheiro da TV é pouco e o que diferencia o Bayern do resto são seus acordos
comerciais de patrocínio que transformaram o time em super potência, Borussia,
Schalke, Leverkusen, entre outros precisam remar muito para oferecer qualquer
resistência.
Quem precisa mudar
Na Itália o
acordo de TV é até justo, não tanto quanto os ingleses, mas justo. A fraca
economia italiana é que acaba com os clubes, os clubes não conseguem boas
campanhas fora do país, mas isso não é um problema de arrecadação de direitos
de transmissão e sim algo muito mais amplo que ultrapassa os limites do
futebol. Primeiro a Itália precisa se recuperar financeiramente como país para
depois pensar no futebol.
A grande
mudança que precisa ser feita é na Espanha, a disparidade de Real Madrid e
Barcelona vem prejudicando muito a Liga, não a toa já existe uma forte
discussão para redistribuição do dinheiro da TV. E essa mudança deve vir mais
cedo do que se espera, o movimento dos clubes começa a ficar mais forte e a
tendência é que seja feita uma completa reformulação na tabela de transmissões,
o mérito como critério deve entrar na conta como nas outras ligas. Claro que
Barcelona e Real Madrid devem continuar ganhando mais, mas não tanto quanto
hoje, tornando a Liga mais equilibrada e consequentemente mais atrativa.
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