Ao longo das últimas semanas, o jornalista Mauro Cezar
(ESPN) vem ironizando o estilo de jogo do Palmeiras e a forma com que a equipe
ganha os seus jogos. A crítica é feita através de um neologismo: o Cucabol. Essa teoria compara o estilo de jogo palmeirense ao praticado pelo São Paulo de
Muricy Ramalho que foi tricampeão brasileiro e venceu muitas partidas com uma
defesa sólida e gols de bola parada e escanteio. Ainda que também tenha seus
méritos na solidez defensiva, essa comparação é injusta e até absurda.
O Palmeiras de Cuca está longe de ser líder por acaso ou
jogando um futebol feio, como defendem alguns. Os últimos jogos não foram
brilhantes, é verdade, mas foram contra equipes fortes do campeonato – dois clássicos,
os cariocas Fla-Flu e o Grêmio. Mesmo assim, o time tem um padrão de jogo e o
foco não é bola aérea.
O VERDADEIRO PALMEIRAS DE CUCA
Dudu e Gabriel Jesus: dupla tem criado muitas chances de gol para o Palmeiras. (Foto: Terra) |
O meio-campo não tem formação fixa. Muitas vezes o time joga
sem aquele volante marcador (Gabriel ou Thiago Santos), não sendo raro iniciar
com Moisés, Tchê Tchê e Cleiton Xavier, três jogadores que sabem construir e
não destruir. Fora de casa, a entrada de um volante de contenção é utilizada
também dando uma variação de jogo, mas mantendo as trocas de posições
constantes. Com isso, Cuca tem praticamente doze titulares e não apenas os onze
habituais.
As jogadas tradicionais do Palmeiras não são bolas alçadas
para a área. Esse é um recurso usado por conta da sua dupla de zaga forte no
jogo aéreo: Mina tem quase dois metros de altura e Vitor Hugo uma das maiores
impulsões. É um recurso válido e que, bem treinado, funciona. Por que ser
descartado? O foco, entretanto, é sempre a busca de transição com bola no chão,
especialmente pelos lados do campo com Dudu e Roger Guedes (ou Erik ou
Allione).
Mesmo em jogos decididos com a bola aérea, é errado dizer
que o jogo do Verdão se limitou a isso. Exemplo? O clássico diante do São Paulo,
vencido na virada com gols de bolas lançadas para a área (Mina e Vitor Hugo
marcaram). O gol poderia ter saído com Rafal Marques, após ótimo lançamento de
Moisés por trás da zaga tricolor. Poderia ter aparecido na ótima jogada e troca
de passes que Allione chegou atrasado. No segundo tempo, Gabriel Jesus recebeu
ótima bola de Dudu, fintou e viu Dênis fazer um milagre. Ocasionalmente, nesse
jogo, as jogadas trabalhadas pararam em Dênis. A bola aérea funcionou – não foi,
de maneira alguma, o único recurso.
É evidente e inegável que a bola parada é uma arma forte
palmeirense. E não há nada de errado nisso: boa parte dos gols do campeonato sai
desta forma. As jogadas são treinadas e devem sim ser aproveitadas. É, porém,
apenas um recurso dos vários que apresenta o time de Cuca cujo jogo é baseado
na movimentação e velocidade do meio para o ataque.
Resumir um time que tem o melhor ataque e a segunda melhor
defesa do campeonato até aqui a alguns chuveirinhos para a área é ignorar muita
coisa: a velocidade e versatilidade de Tchê Tchê, a intensidade na marcação e
armação de Moisés, além dos rápidos e decisivos Dudu e Gabriel Jesus.
O PALMEIRAS EM NÚMEROS
Vitor Hugo e Mina: fortes no jogo aéreo, uma das principais jogadas do Palmeiras, mas não a única. (Foto: ESPN) |
E tudo isso não fica apenas no plano teórico. É só olhar
para toda a campanha palmeirense e chegar a essa mesma conclusão. Olhando os
números, isso fica ainda mais evidente. O Palmeiras marcou 21 dos seus 45 gols
até aqui em jogadas criadas, tocando bola, com movimentação e infiltração. Isso
representa quase metade dos gols marcados (47%). Para efeitos de comparação, o
vice-líder Flamengo marcou 15 gols desta forma, aproximadamente 42% do total.
É importante dizer que existe uma diferença entre alçar
bolas para a área adversária de qualquer lugar do campo (Cucabol?) ou criar
jogadas e realizar um passe pelo alto na cabeça de um companheiro. Cleiton
Xavier marcou de cabeça contra o Corinthians em rebote após uma ótima jogada
trabalhada pelo chão. Gabriel Jesus recebeu passe de Zé Roberto livre e
deslocou o goleiro contra o Figueirense. São jogadas criadas, não simplesmente
bolas alçadas para a área.
Não que o Palmeiras não use da bola aérea, é uma jogada
forte sim do time alviverde. Foram oito gols desta forma e não há demérito
nenhum, é apenas uma forma de marcar gols e utilizada por todos os times do
mundo. E mesmo assim, em alguns desses gols de escanteio, a jogada foi
trabalhada como foi diante do Vitória, quando o foi batido curto e, na
continuidade, Barrios marcou. Para cada gol de escanteio marcado, portanto, o
Palmeiras marca outros três em jogadas construídas.
Outra jogada muito criticada é a bola lateral arremessada
para dentro da área com Moisés. Em um esporte cuja cultura é de que lateral não
resulta em gol (quantas vezes já ouvimos um “é absurdo levar gol de lateral”?),
o Verdão conseguiu marcar quatro vezes. Se é uma jogada que resulta em gol, por
que deixar de executá-la?
As faltas lançadas para a área resultaram em outros cinco
gols palmeirenses. Os flamenguistas fizeram quatro gols desta mesma maneira. O
Flamengo é líder em penalidades marcadas e converteu quatro dessas cobranças,
enquanto o Palmeiras marcou três vezes. Por fim, ainda olhando números, o
rubro-negro tem muitos cruzamentos a mais do que o alviverde em toda competição.
Essa diferença toda pode ser vista até na última rodada. O
Flamengo, em casa, executou vinte cruzamentos contra a área dos catarinenses
somente no primeiro tempo. O Palmeiras, fora de casa, realizou oito em toda
partida. O time carioca não recebe alcunhas irônicas como “Ricardobol” ou coisa
semelhante, mesmo com números bastante parecidos – coisa que, diga-se, seria
muito injusta também pelo bom futebol apresentado pelos cariocas.
Portanto, palmeirense, cuidado ao ver essa alcunha. O Verdão
pode não ter feito jogos brilhantes nas últimas rodadas e não fez por conta das
dificuldades impostas. O futebol palmeirense tem qualidades e defeitos, como
todos os times do campeonato. Se vai ser campeão ou não, é outra história.
O Flamengo, assim como o Palmeiras e assim como Atlético-MG
e Santos, joga um futebol bem legal de se ver. Os quatro têm um nível bastante
semelhante e os detalhes vão decidir. De qualquer forma, não se incomodem com
alcunhas negativas. Lembre-se que o Santos já era cravado como campeão na Copa
do Brasil de 2015.
De qualquer forma, caso insistam nessa definição, com o
melhor ataque, a segunda melhor defesa, um dos artilheiros, um dos líderes em
assistências, sendo um dos melhores mandantes e também um dos melhores
visitantes, esse tal de Cucabol não parece tão ruim assim. Ou parece, mas
apenas para os olhos de quem torce contra.
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