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Sonhos vêm, sonhos vão e a humanidade fica. #ValeuChape

“Por debaixo desta certeza tranquilizadora percebia, contudo, o remoer surdo de uma dúvida, talvez se tratasse de um sonho enganador, um sonho de que teria de acordar mais cedo ou mais tarde, sem saber, nesse momento, que realidade estaria à sua espera” (José Saramago, Ensaio a Cegueira).

O dia começou estranho, cinzento, faltava algo, era vazio. Acordei aqui em Belo Horizonte com o coração na garganta, um aperto, meus sentidos me alertavam que algo terrível estaria por acontecer. Como reflexo peguei meu celular, mais ou menos as seis da manhã, e me deparei com a notícia, um direto de Mike Tyson na boca do meu fígado. O avião que levava a Chape a Colômbia havia caído, no exato momento acordei meu pai para contar a notícia, ele também não acreditou no que estava acontecendo, não parecia ser verdade. 
No exato momento eu pensei...minto nós pensamos em uma mesma palavra: sonho.



Aquela aeronave transbordava sonhos! Os sonhos de garotos que comeram o pão que o diabo amaçou para chegarem ao futebol profissional. Muitos deles saíram de casa cedo, saíram de perto de suas famílias, passaram fome e frio para viverem uma aventura. Nem 1% consegue chegar lá, e os que chegaram sabem exatamente a dificuldade necessária para se atingir a excelência. Em casa tenho um irmão mais novo que está vivendo esse sonho, que voa para São Paulo, Recife, Porto Alegre, jogando em todo tipo de campo em busca de uma chance, em busca da fantasia de ser um jogador de futebol, como 11 em cada 10 meninos dessa terra Brasilis.

E se o meu irmão estivesse lá? Nesse primeiro momento a primeira lágrima escorreu em meus olhos.

Por outro lado, pensando no âmbito esportivo, esse clube, a Chape, em um passado não muito distante estava na série D, como muitos outros clubes do Brasil vivia apenas da paixão de alguns abnegados do corpo diretivo e claro, de sua torcida. As vezes enxergamos o futebol apenas sob o olhar dos grandes clubes, das grandes massas, contudo, as vezes a realidade dos pequenos centros é tão ou mais visceral quanto. Quem torce sabe, quem sofre sabe.



Não é apenas futebol. Como colunista e membro do Linha de Fundo pude entender um pouco melhor disso através do convívio com os meus colegas torcedores que escreviam sobre essas realidades. Pensava comigo como pode, como esses caras conseguem ser tão fanáticos?  Talvez o mais “doente”, seja o portador do maior sofrimento do meu círculo de amigos. Falo do meu parceiro de Unanimidades e amigo Marcelo Weber, colunista da Chapecoense (PQP o Marcelo... outro pensamento que povou minha memória ao longo de todo dia). Esse cara redefiniu meu conceito de fanatismo, e talvez eu agradeça eternamente por esse novo aprendizado, por essa nova percepção que aprendi com ele e todos os outros. 

O Marcelo graças a Deus não estava no avião, mas eu sei que parte dele também se foi, e parte de mim o acompanhou em solidariedade.

Jamais entenderei os sentimentos do meu amigo, tentei imaginar se em 2013 depois de o Victor ter salvado o penalty do Riascos, o meu Atlético se envolvesse em um acidente como esse a caminho de Rosário ou de Assunção, acho que perderia meu chão. 

Meus caros, era sonho, fico imaginando se meu sonho como torcedor acabasse assim, enfim...olhos embargados novamente.

Para finalizar este pequeno ensaio, como diria Almir Sater, em sua icônica Tocando em Frente:

“É preciso amor; Pra poder pulsar; É preciso paz pra poder sorrir; É preciso a chuva para florir;

Da chuva, desse desastre eu vi nas redes sociais uma mobilização e uma sensibilização de tanta gente, de tantos torcedores e de tantos clubes que não via há muito tempo. Em uma época recheada ódio, e preconceito, vi um vestígio de humanidade, uma humanidade que sinceramente achei que estava perdida. 

Reza a lenda que o Índio Condá uniu todas as tribos da região de Chapecó em torno de um bem comum, de um bem maior. Estes jogadores, comissão técnica, jornalistas, dirigentes que vieram a óbito nessa tragédia fizeram o mesmo. 

Espero do fundo do meu coração que a comunidade do futebol, melhor, que o povo brasileiro honre o nome desses heróis em atitudes e ações que elevem nossa grandeza como seres humanos, com altruísmo e solidariedade com nossos iguais. 

A partir de hoje seremos todos Chape!


Olê, Olê, Olê, Olê...Chape Chape! 


por Matheus Henrique Valle e toda equipe do Linha de Fundo

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